Por Silas Daniel
Não há como
falar de Igreja Emergente sem falarmos de um de seus pressupostos mais amados:
a Teologia Narrativa. Esse pressuposto está vinculado diretamente ao conceito
de Hermenêutica Generosa ou Hermenêutica Pós-moderna, de que já falamos. O nome
Teologia Narrativa se deve ao fato de que seus adeptos propõem que a Bíblia
precisa ser entendida não como uma obra proposicional, que apresenta doutrinas,
mas tão somente como uma grande narrativa devocional que deve ser lida e
interpretada sem preocupação com as regras de hermenêutica.
A Teologia
Narrativa seria, portanto, uma construção teológica supostamente alternativa
contra o que os emergentes chamam de repetição dogmática ou rigidez cientifica
na interpretação da Bíblia.
ONDE TUDO
COMEÇOU
A gênese da
Teologia Narrativa, por incrível que possa parecer, se deu com o filosofo ateu,
anticristão e anti-valores Friedrich Nietzsche (1844-1900).
Mas, como
assim? O que esse filosofo anticristão e anti-Deus tem a ver com uma teologia
que se propõe crista?
Nietzsche e
considerado o pai da pós-modernidade e tem esse título justamente porque
iniciou a crítica contundente e acida a todo tipo de instituição ou de valor
absoluto, e esse tipo de crítica acabou sendo absorvido como uma característica
básica da pós-modernidade.
Filho de um
pastor luterano chamado Karl Ludwig, que morreu prematuramente, Nietzsche
inicialmente queria ser pastor como o pai, porém, em 1864, abandonou o projeto
para se formar em Filologia. Logo que se formou, conseguiu um emprego como
professor de Filologia Clássica na Universidade de Basileia, na Suíça.
Ainda jovem e
já lecionando, Nietzsche resolveu publicar seus primeiros livros, mas teve o
desprazer de ver suas obras rejeitadas pela crítica a ponto de ter sido até
mesmo excluído do círculo de filólogos de sua época. Frustrado e deprimido,
Nietzsche decide, então, ser um “espirito livre”, como se definiu, e escrever
contra tudo que antes defendera. Se antes escrevera defendendo o musico Wagner
e o filosofo Schopenhauer, agora passa a ataca-los. Renuncia o que chamou de “vontade
culpada” de Schopenhauer, substituindo-a pelo que define como “vontade alegre”.
Se louvara o “espirito alemão”, agora passou a despreza-lo. Em Humano, demasiado
humano (1878), sua primeira obra da nova fase, ele afirma que o homem e o
criador dos valores, mas costuma esquecer sua própria criação vendo nela algo
de “transcendente”, “eterno” e “verdadeiro”, quando os valores não seriam mais
do que algo “humano, demasiado humano”. Ele defende as mesmas ideias em dois
outros livros: Para além do bem e do mal (1885) e. Para uma genealogia da moral
(1887). O britânico C. S. Lewis
desintegraria tais ideias brilhantemente nos primeiros capítulos de sua obra Cristianismo
Puro e Simples. Ele não foi o único a fazê-lo, mas sua abordagem sobre o
assunto e uma das mais precisas.
Em Crepúsculo
dos ídolos ou como filosofar com o martelo (1888), os ataques de Nietzsche
são contra o Estado, as instituições, a moral, o espirito alemão, as ilusões da
filosofia e a verdade. Ainda em 1888, publica Anticristo, onde ataca
tudo o que é cristão ou esteja “infectado” pelo cristianismo.
Resumindo,
Nietzsche, que e mais conhecido por ter declarado “Deus está morto”, negou a
existência de qualquer tipo de valor absoluto e proclamou o desprezo as
instituições. Terminou louco e assim morreu em 1900, mas a influência dos seus
escritos se fez sentir no início do século 20 e, no meio filosófico,
especialmente na Franca dos anos 60. Foi ali que, há pouco mais de 40 anos,
inspirados por Nietzche, três filósofos — Michel Foucault (1926-1984), Jacques
Derrida (1930-2004) e Julia Kristeva (1941-) – iniciaram dois movimentos
simultâneos chamados pós-estruturalismo e desconstrutivismo, que, mais tarde,
aplicados a hermenêutica bíblica, criaram a Teologia Narrativa.
Foucault foi
um famoso filosofo e professor de História dos Sistemas de Pensamento no
College de France de 1970 a 1984. Homossexual e adepto de uma vida desregrada,
ele faleceu aos 57 anos, em decorrência de AIDS. Porém, antes de morrer, deixou
sua marca em favor do pós-estruturalismo e do desconstrutivismo ao criar e
popularizar a teoria de que todo tipo de discurso e, no fundo e sempre, uma
tentativa de exercer influência e poder sobre as pessoas. Ele era contra todo e
qualquer tabu social e tinha aversão ao discurso cristão ou religioso de forma
geral.
De origem
judaica, Jacques Derrida nasceu na Argélia, então colônia francesa, e sofreu
muito em sua infância por causa do anti-semitismo. Já na juventude, tornou-se
discípulo confesso dos escritos dos ateus Friedrich Nietzsche, Jean-Jacques
Rousseau e Albert Camus. Inspirado nesses seus ídolos, Derrida fundou o
desconstrutivismo, tese que propõe a indeterminação do sentido dos textos.
Explicando: segundo Derrida, qualquer texto deve ser lido sem procurarmos
qualquer intenção do autor por trás dele. Para o francês, só interpretamos
melhor uma obra quando não buscamos um proposito autoral por trás dessa obra. Caberia
a cada leitor, portanto, dar aos textos o significado que ele mesmo acha que
tenham. Outro detalhe e que os significados dados devem ser não apenas
independentes do objetivo revelado pelo autor da obra, mas também de qualquer
interpretação decorrente dos métodos tradicionais de interpretação de textos.
Isto e, os princípios hermenêuticos clássicos devem ser desprezados totalmente.
Isso e desconstrutivismo. Já a filosofa franco-búlgara Julia Kristeva, que
também e psicanalista e critica literária, além de defender o desconstrutivismo
e o pós-estruturalismo, foi líder do movimento feminista na Franca, tendo
também exercido forte influência no movimento feminista da Inglaterra e dos
Estados Unidos. Ela defende enfaticamente a relativização dos valores,
princípio básico da pós-modernidade. Aliás, o pós-estruturalismo, bandeira
empunhada pelo trio Foucault, Derrida e Kristeva, e basicamente a negação da
existência de verdades absolutas. Foi aplicando o pós-estruturalismo e o
desconstrutivismo de Derrida, Foucault e Kristeva a teologia que nasceu a
Teologia Narrativa, defendida hoje pela maioria esmagadora dos teólogos adeptos
da Igreja Emergente e por alguns cristãos simpatizantes.
Trecho do
livro, A SEDUÇÃO DAS NOVAS TEOLOGIAS - Silas Daniel: CPAD.
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